quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Não gosto de futebol, mas gosto do Juventus

José Rodrigo Rodriguez

O Clube Atlético Juventus e a Mooca estarão sempre juntos na memória dos paulistanos. Mas para quem vive, viveu no bairro ou o freqüenta (meus avós moravam na Rua Ana Néri), a coisa é um pouco mais séria, um pouco mais difícil de definir.

Não se trata exatamente de uma paixão: deixemos de lado os clichês. Não é a tradição ou a simpatia do Moleque Travesso que, de maneira inexplicável, ganha jogos impossíveis e perde jogos fáceis .

Tampouco é a ligação do time com a comunidade italiana, tão importante para a Mooca e para a cidade de São Paulo. O Juventus não se explica por nada disso e não se deixa captar por nenhuma frase feita.

Talvez o time se explique por um interessante fenômeno: o Juventus é o que restou em mim do tempo em que eu gostava de futebol.

Eu era corintiano. Roxo. Acompanhava todos os jogos e assistia mesas redondas. Comprava a camisa de meu time e ia com ela ao estádio. Ficava emocionado em todos os jogos, discutia táticas e negociações de jogadores; escalava times com os melhores de todos os tempos. Dias e dias de conversas e furiosas polêmicas: o pacote completo.

Tudo isso passou.

Hoje não leio sequer o suplemento esportivo de meu jornal diário. Não sei os resultados das partidas do final de semana, a escalação do meu time ou a classificação de nossos principais campeonatos. Quando estou no bar, fico torcendo para que os amigos mudem de assunto.

Fico torcendo para que ninguém me faça uma pergunta direta sobre meu time ou sobre um tema qualquer, desses capazes de despertar a eloqüência de todo amante do Futebol. Para falar a verdade, o assunto me irrita, me incomoda; até me enerva um pouco. Melhor deixar para lá. Pois eu lembro exatamente o dia em que deixei de amar o futebol. Lembro da hora e do lugar, dos detalhes e das circunstâncias.

Era uma noite de junho, não estava muito frio. Cheguei cedo da faculdade e peguei algo para comer. Guardei meus livros no armário, tirei os sapatos, a jaqueta. Fui ao banheiro do corredor antes de sentar no sofá.

Comecei uma conversa que nunca terminou: meu pai morreu na minha frente, sem dar nenhum aviso. Meu futebol morreu com ele. Mas o Juventus, não.

O futebol não saiu completamente da minha vida. Ainda assisto a alguns jogos e sigo parte dos campeonatos. Apenas quando estou com meus irmãos, como meu pai faria. Não são meus filhos é certo, eles são os filhos dele. Por isso quando eu tiver os meus, não vai ser a mesma coisa.

Assisto aos jogos com eles, fingindo prestar atenção. Fingindo que me importo, finjo estar me divertindo. Finjo os gritos de gol e a tristeza da derrota. Com meus irmãos creio até ser capaz de ver um jogo ao vivo.

Comer vários cachorros frios, beber cerveja morna e cara. Pagar por lugares numerados mesmo sem ter muito dinheiro. Só para levar os meninos, como meu pai faria. Como ele fez tantas vezes, como eu gosto de lembrar.

Fazer tudo isso sozinho dói demais. Mas não dói ver o Juventus. Ele ficou. Mas por quê?

Não sei ao certo.

Todas as semanas visitávamos meus avós na Mooca e todas as semanas passávamos em frente ao clube. Todos os domingos, macarrão do Pastifício Mero: todos os domingos da minha vida. Fui algumas vezes ao estádio, principalmente quando era bem pequeno. Lá na Rua Javari, a rua da nossa pizzaria.

Eu era bem pequeno e o Juventus estava junto de todas essas coisas. Um projeto de gente, perto de todos os meninos. À vista de todos os homens, perto da casa da minha vó. Na boca dos avôs e suas mulheres; de seus filhos e de suas filhas. Ao alcance de qualquer pessoa, o Juventus nos preenchia.

Hoje não leio mais o jornal e finjo que gosto de assistir aos jogos. Finjo os gritos de gol, mas mesmo assim, assisto. Às vezes eu ligo a TV, às vezes convido um amigo. Ajudo a pagar a TV a cabo. Pay per view: Campeonato Brasileiro, Campeonato Paulista.

Pensando bem, pode ser até que eu volte a gostar de futebol! Mas o Juventus ficou, ele e seus jogos impossiveis. O Juventus ficou, com suas derrotas incriveis. O Juventus ficou, até eu deixar de ser gente.

2 comentários:

Marco Antonio Parana disse...

Caro amigo José Rodrigues,
Fico muito honrado em telo como colaborador.
Muito obrigado e fique à-vontade para expor suas idéias, críticas, dicas e sugestões.
Abraços,
Marco Paraná

Anônimo disse...

Zé, querido,
Não sabia porque vc não torcia mais pelo seu time. Engraçado eu não saber, se este assunto, perda de pai/mãe, sempre povou e povoa nossas conversas.
Agora entendo o porquê.
Acho que o Juventus remete aos bons tempos de criança que vc teve. E como ele é um tanto quanto inofensivo, ele só gera admiração e alegrias.
Quero ir assistir a um jogo dele. Marco Aurélio disse-me que é sensacional ver os velhinhos gritarem pro time, que joga próximo à arquibancada.
Vamos todos juntos?
Beijos.